NATAL DE HERODES



…for me personally at this moment it would mean that God had given me the power to destroy Himself. I refuse to be taken in.”

AUDEN. The massacre of the innocents.

Nasce. E me apavora
sabê-Lo. Foi um pesadelo:
a manjedoura,
os bichos de pelo
que O circundam.
Não posso crê-lo:
mente o demônio
vindo em meu sonho,
que um rei não nasce
como um campônio!
Mas a estrela – dá-se
que a estrela paira
ainda lá?
Mentiram-me os magos?
Ou mente o demônio,
que é pai da mentira?
Quisera eu primeiro
adorá-Lo; primeiro
com ouro, incenso, mirra
e depois afagos
de O esganar.
Chora? Será que chora
o Menino – me apavora
imaginar
que o Menino chora,
e não estertora,
é por respirar. Nasce
e o esboço de Face
tem de quem o olhar?
De qualquer Maria,
de um José qualquer,
daqui ou da freguesia
de Nazaré?
Com quem se parece?
Perguntei: com Quem?
Nasce – e apavora pensar
que nasceu alguém
que nasceu Alguém
no meu pesadelo
e o demônio vem
me anunciar
como um anjo fê-lo,
mas por me enganar;
e se persuade,
sabê-lo, quem há de?
Vou mandar matar;
a contabilidade
diz-me de dois anos
a engatinhar;
mas serei vassalo
e será maldade?
Ou somente rei
se o recusar?
E será bondade?
Apavora pensar
que posso bondade
com a Natividade
desse Rei dos reis
que é rei de Judá.
É saber: não há.
Mas nasce.... Nasce.
Razão é governar.
E para acalmar
só para acalmar
a superstição,
esta noite não,
mas ao levantar
vou mandar matar.
Massacre dos Inocentes. Léon Cogniet (1824).






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